quinta-feira, 1 de abril de 2004

Mitologia




Queria prender o Tempo numa garrafa
Escondê-la algures onde não me lembrasse mais.
Perder-lhe completamente o tino,
Esquecê-la e não mais a procurar.
Queria poder segurar o Sol,
Conter a Sua luz em minhas mãos
Para a poder levar junto de ti
E mostrar-lhe como esmorece face ao teu brilho.
Queria poder transportar a Lua,
Encastra-la numa joia,
Num colar de valor incalculável
Sabendo que sua graça
Ficaria assombrada por ti
Ao adornar o teu pescoço.
Queria ser mágico
E conjurar os Poderes,
Invocar os Anjos e os Deuses
Para poder mudar o Mundo
E ajustá-lo só para nós.
Convocaria Marte
Para fazer guerra às vozes maldosas que nos odeiam.
Vulcano,
Para fazer espadas e ripostar com ferro à inveja.
Chamaria Baco,
Para embriagar os felizes e distraídos
Mantendo-os na Santa Ignorância
Sem quererem mal a ninguém nem saberem o que os rodeia.
Invocaria Vénus,
Para que te servisse
E te tratasse com o respeito que a tua divindade merece.
Apelaria a Mercúrio,
Para que corresse a todos os cantos do mundo
Gritando o nosso Amor e ameaçando quem tentasse ver mal nele.
Imploraria a Cronos que parasse o tempo
De cada vez que estivéssemos juntos
Para que cada momento durasse uma eternidade.
Lembrar-me-ia de Morfeu,
Toda a vez que o sono pesasse em meus olhos
E pudesse pousar a cabeça em teu colo aconchegante e convidativo.
Seria enfim Zeus ou Júpiter,
Quem comandaria esta hoste divina
Que velaria por nós não permitindo que nada de mal nos acontecesse.
Mas eu não posso tocar os Astros nem invocar os Deuses
E o tempo escoa-se-me por entre as mãos
Como a areia corre na ampulheta.
Mercúrio não corre em meu auxilio,
Cronos não quer parar o tempo,
Marte está ocupado em outras guerras...
Só Afrodite ficou...
Encarcerada em ti num corpo de Deusa,
Olhos de diamante
E rosto de Anjo
Lembrando a este pobre mortal
Que a vida é curta e o paraíso está muito longe.
Dando um pequeno vislumbre
Da beleza da Criação de Deus
E de como o Mundo pode ser perfeito e belo.
E o tempo corre inexoravelmente
Arrastando atrás de si farrapos de vidas incompletas,
Trazendo a neve aos cabelos e a tortura aos ossos.
Tiquetaqueando segundo após segundo.
E eu fico sempre
Vendo-te a meu lado
Sorrindo como o Sol no teu rosto de Lua.
Sou como uma criança pendurada num muro intransponível
Assombrado pela beleza da ninfa que dança do outro lado.
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sábado, 27 de março de 2004

Tens razão




Tens razão, aliás como sempre,
Que há para dizer mais?
Depois de tanto tempo sem falar,
Tantas palavras que não foram ditas,
Outras tantas que não foram preciso dizer.
Durante tanto tempo, uma eternidade, me parece,
Foste a minha Estrela da Manhã,
A brilhar na génese do meu dia,
Aqueceste-me e ofuscaste-me
Com o teu calor e a tua luz
Ao ser o meu Sol de meio-dia.
E até pela noite estavas comigo,
Lua cheia distante,
Iluminando os meus passos noturnos.
E eu estava sempre contigo,
E via-te sempre comigo, cabeça com cabeça,
Olhos nos olhos.
E era só fechar os olhos para sentir,
O calor do teu rosto no meu,
O toque aveludado dos teus lábios nos meus.
Mas como sempre tens razão,
Que há para dizer mais?
Exceto que as minhas manhãs,
São um de um ar sombrio,
Porque as estrelas não estão lá.
As minhas tardes ensolaradas,
Estão sem cor,
Dominadas por um teto de nuvens
Que ameaça chuva.
E as minhas noites…
As minhas intermináveis noites,
São vazias e sem luz,
Com o veludo negro do céu
Manchado por cúmulos errantes e negros.
E eu sinto-te sempre comigo,
Pensamento com pensamento,
Ora odeias-me, ora sofres comigo.
E eu fecho os olhos,
E parece que te encontro,
Algures entre meus conturbados pensamentos,
Voltando para mim o teu olhar triste…
Mas como sempre tens razão,
Que há para dizer mais?
Exceto que te amo e amarei,
Que ficou marcado a fogo no meu coração
O amor que tenho por ti
E que tu deliciosamente correspondeste.
Que está incrustado em minha Alma,
Cada momento que passamos juntos.
Que cada olhar que me consegues dar
É um sol radioso que rompe as nuvens.
Cada sorriso que me dedicas,
É o brilho e a cor que regressam,
Cheias de Esperança.
Conseguimos enfim arrastar o calor do Verão,
Até ao pino do Inverno.
E agora o vento frio e a chuva,
Imperam nos nossos dias,
Porque os deixamos colocar-se entre nós.
E o Estio é uma lembrança distante,
Que eu quero conservar comigo,
Na esperança de algum dia cumprir o meu destino.
Mas como sempre tens razão,
Que há para dizer mais?
Exceto que bons ou maus momentos,
Voltaria viver cada um dos que vivi contigo.
Voltaria a sofrer quando sofri
E a rir quando ri, a amar quando amamos,
Sempre sabendo como tudo iria terminar,
Vivendo um minuto de cada vez.
Mas como sempre tens razão,
Que há para dizer mais?
Exceto que valeu cada minuto,
E que não quero que termine nunca…
Obrigado por existires.


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quinta-feira, 5 de fevereiro de 2004

Sal da Vida


Ao fim e ao cabo tudo se resume
À chama que arde
Ao lume que consome o nosso coração.
Calor intenso que em todo o dia que se perde,
Em toda a hora que se esvai,
Queima e cresta a sensível Alma.
Mas não deixes o desespero dominar,
Não desprezes o Sal da Vida
E abana a Árvore da Tentação.
Prova dos seus frutos, aprecia a sua doçura,
E vive ao sabor da vida,
Remando sempre contra a maré.
Não te deixes cair no desânimo
E deixa a Chama arder bem forte no peito.
Assim terás sempre a certeza,
Enquanto a sentires queimar,
Enquanto a adrenalina correr nas tuas veias,
Será certamente porque estás viva.
Mas não deixes o desespero dominar,
Não desprezes o Sal da Vida
E abana a Árvore da Tentação.
Embaraça o empregado do café,
Escandaliza a vizinha da frente,
Inferniza a vida dos teus colegas.
Sente-te viva e sacode a tua vida,
Bem como a daqueles que te rodeiam.
Não te deixes sufocar e agride-os com teu sorriso,
Atordoa-os com teu gargalhar,
Mostra-lhes que a vida deve ser vivida
E que tu fazes questão de o fazer.
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sexta-feira, 23 de janeiro de 2004

Angústia



Não é possível descrever a angustia,
Do querer e não poder ter.
A dor do rasgar da Alma porque,
Ao fincar o pé não me deixo arrastar.
A consciência é o flagelo que Deus nos deixou,
O coração, o instrumento enganador que bate quando não deve.
E a Alma…
A Alma sofre com a antítese constante dos dois.
Mas não é por isso que tudo passa.
Não é pela consciência nos flagelar,
Que o coração deixa de se partir
E a nossa mente voa perdida.
Também eu vagueio pelas recordações,
Suspirando à mais pequena memória tua.
Sinto o coração saltar,
De cada vez que o telemóvel dá mensagem.
A minha respiração sustém-se,
Cada vez que te vejo ou ouço.
As musicas doem ao ouvir porque,
Cada lamento é de uma alma gémea,
Que sentiu e sabe o que eu sinto.
Resta sonhar durante o tempo que resta,
Esperar que passe o tempo que não passa,
Desejar o que não devo desejar
E pedir a Deus o que não devo ter.
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