José Mendonça 1932 - 2017 |
No dia em que te foste, como um alucinado, corri quilómetros para ver com os meus olhos, aquilo que não acreditava.
No dia em que te foste, atravessei este país, que tanto amavas, para te ver e despedir-me uma última vez. Cruzei distâncias imensas de matas queimadas, como se o mundo se tivesse tornado um gigantesco cemitério de árvores negras. Ainda bem que já não o viste, para que não se enegrecesse também o teu coração.
No dia em que te foste, a raiva ferveu em meu peito e as lágrimas explodiram em meus olhos. Não saíam as palavras que eu queria e o amor dos que te queriam sufocava-me e doía-me... porque te foste e nos deixaste.
No dia em que te foste, o sol brilhava com força sobre as tuas saudosas planícies alentejanas e os pássaros chilreavam alegremente nas copas das das azinheiras. Saberiam eles que nos deixaste? Saberiam os pássaros e o sol, que te foste desta vida de sofrimento? Não deveria o sol fazer luto e os pássaros silêncio?
No dia em que te foste, visitei mentalmente todos os locais que amavas e contigo recordei as verdes vinhas do Douro, as abrasadoras planuras do Alentejo e os lânguidos braços da ria de Aveiro e senti que agora estavas livre. A tua alma forte e indómita, estava finalmente despojada do involucro, que te serviu bem por muitos anos, mas agora gasto e doente. Grande como o mundo, tua alma se expandiu sobre tudo o que amavas, para derramar bocadinhos do teu ser.
No dia em que te foste, vi no teu rosto sereno, que partiste em paz e não havia mágoa nem dor em teu coração, apenas a certeza que caminhaste para algo superior a todos nós, onde não há lugar para esses sentimentos.
No dia em que te foste, o tudo parecia igual ao dia anterior... mas tão pobre que ficou o meu mundo...